domingo, 9 de julho de 2017

SURGIMENTO DA CLÍNICA

Podemos compreender o surgimento de um princípio da clínica psicológica ainda na antiga Grécia, por volta de quatrocentos a.C., com um sofista conhecido como Antífon (também encontrado na grafia Antífonte). Apesar de a palavra clínica ter sido herdada pela psicologia através de sua ligação médica inicial, o conceito de atendimento, como um cuidado da mente do outro, é anterior a própria consolidação da medicina.
A palavra clínica tem como uso inicial o cuidado médico dado aos seus pacientes através da inclinação sobre o leito, para examinar o paciente. O exame antes da possibilidade dos métodos atuais de raios-X, ultrassonografia e outros, se dava através de uma entrevista, questionando os sintomas e histórico do paciente, além da observação da própria aparência e reações do mesmo. Assim, a palavra clínica fica associada tanto ao ato de inclinar-se sobre o leito, como o próprio ato de cuidado e entrevista, que situaria-se melhor em uma perspectiva psicológica.
Apesar de a palavra clínica estar diretamente ligada a medicina, principalmente pelo fato de as primeiras atuações clínicas tanto no tratamento da saúde em geral como no tratamento psíquico, terem sido iniciadas pelos médicos (Cordioli, 2008), quando falamos em clínica psicológica como método e ideia, podemos buscar sua origem anteriormente, na época em que a medicina “engatinhava”. Façamos então um resgate das ideias de um sofista grego que viveu de quatrocentos e setenta a quatrocentos e onze anos a.C. Antífon, este pioneiro do cuidado através das palavras, segundo Kerferd (2003) instituiu, em corinto uma espécie de consultório, no qual em paralelo ao tratamento médico convencional, promovia uma escuta e espécie de aconselhamento, com a intenção de aliviar as pessoas de suas angústias. Se considerarmos segundo Cordioli (2008) os princípios comuns a psicoterapias, veremos que esse ato de Antífon de buscar aliviar o sofrimento de quem o procurava, se encaixa de maneira muito eficaz na ideia de psicoterapia, pois havia a busca de ajuda por parte de um sujeito em sofrimento, que acreditava que Antífon poderia auxiliá-lo e tudo leva a crer que o sofista possuía um esquema de compreensão do sofrimento e uma técnica bem elaborada para trabalhar nessa perspectiva. As confirmações são frágeis devido a terem restado poucos registros dos originais de Antífon.
A psicologia de modo geral sempre caminhou em conjunto com a filosofia e a medicina, tanto na antiga Grécia com Antífon e Sócrates, que estudavam sentimentos e características humanas, como mais tarde com Sigmund Freud, um dos pioneiros a retomar a ideia de clínica psicológica. Freud foi um médico neurologista, que estudou a filosofia e mantinha com essa uma relação ambígua de apreço e desprezo, foi ele um dos principais responsáveis por desenvolver a ideia de tratar um tipo de sofrimento psíquico específico, as neuroses, através da fala, método terapêutico comum à maioria das psicoterapias.
Por volta de mil e novecentos, o médico austríaco Sigmund Freud em conversa com seu colega de profissão Josef Breuer, iniciava a compreensão das neuroses e suas possibilidades de tratamentos. Freud compreendeu que era possível aliviar o sofrimento de seus pacientes através do relato de suas vidas, através do método de associação livre de palavras (Freud, 1987). Não discutiremos mais a fundo para não nos desviarmos do enfoque deste trabalho, pois o que de fato nos interessa aqui, é que no ato de ouvir seus pacientes, e tratá-los basicamente através da oralidade, Freud moldou o que seria uma das essências da maioria das futuras psicoterapias, e também a aparência da clínica psicológica, pois até a atualidade é muito comum que a ideia de clínica psicológica, seja associada a um consultório charmoso com quadros e seu divã, clara herança freudiana.
É intrigante pensarmos que até a atualidade muitos associam a ideia de clínica a um consultório ou a qualquer outro espaço físico, pois se relembrarmos o discutido anteriormente percebemos que desde seu início, a clínica constitui-se como uma ação, o debruçar-se sobre o leito, ou o ato de cuidado, não estando vinculada necessariamente a um espaço físico, apesar de que a clínica comum permanecerá por muito tempo atrelada a essa noção.

REFERÊNCIAS:

Cordioli, A. V. Psicoterapias abordagens atuais. Artmed 3º ed. 2008.

Kerferd, G.B. O movimento Sofista. São Paulo SP. 2003. Edições Loyola.

Freud, S. (1987) Cinco Lições de Psicanálise. In: Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Vol. XI. Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente Publicado em 1910)


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