sábado, 15 de julho de 2017

SOBRE SAÚDE

A partir de diversas perspectivas pode-se entender a saúde e doença de maneiras variadas:
Saúde = vigor, bem-estar, força; Definição corriqueira inclusive ao senso comum.
Saúde = ausência de doença; Visão biomédica que define por excelência o que não é saúde ao invés do que de fato ela o é. Além de ter um enfoque maior na doença do que no sujeito em si. Preocupa-se em remover a doença, sem dar à devida atenção a relação estabelecida entre essa doença e o sujeito. Também desconsidera a relação da doença com a vida desse sujeito, com seu contexto sociocultural. O que por sua vez acaba gerando situações como um individuo que não adere ao tratamento, porque existem questões culturais ignoradas que não o permitem, ou nos casos por exemplo de HIV/AIDS que o individuo não segue o tratamento por motivos sociais estigmatizados que por vezes são desconsiderados pela área da saúde. 
Saúde = completo estado de bem estar físico, psíquico e social; Utópico, se considerarmos o completo bem estar, ninguém se encontra em tal estado. Mas ainda assim é mais abrangente que as definições anteriores.
Saúde como equilíbrio; Visa um fim ignorando o processo, é como se um sujeito somente pudesse estar saudável quando atinge o equilíbrio, durante todo esse processo ele então seria um “sujeito doente”?
Saúde como criação de novas normas (Canguilhem) Nesse entendimento a saúde deixa de ser uma finalidade e até mesmo um silêncio dos órgãos. Deixa-se de lado ideias do que a saúde não é e também de ser uma finalidade quase inalcançável, a saúde torna-se um processo de adaptação e construção aos novos imprevistos impostos. 
Em uma visão mais abrangente se entende a necessidade de estudar a doença e saúde não como um conceito estagnado e imutável, mas sim como uma definição maleável que considere os vários aspectos culturais, sociais e econômicos, de cada sujeito como singular, único, porém dentro de todo um contexto construído por ele e que o constrói.
EX: A loucura entendida em contexto hospitalar clínico é o milagre de algumas religiões.
Também se faz necessário compreender a construção histórico sociocultural da “doença”. A própria loucura ao longo da história teve diversos olhares lançados a sua compreensão, como um desarranjo orgânico (Hipócrates), como uma maldição de deus ou possessão demoníaca (idade das trevas ou medieval) no mesmo período ainda também vista como bruxaria em alguns casos. Posteriormente se deixou de exterminar esses sujeitos, para promover uma exclusão social, já não se queimava-os vivos em fogueiras, mas os trancafiamos em grande depósitos de “loucos” aos quais chamamos por diversos nomes: Hospícios, manicômios, hospitais psiquiátricos; mas assim como dor, mal estar, incomodo, patologia, podem ser utilizados para definições semelhantes, do mesmo modo todos os nomes dados a esses depósitos de pessoas, traduzem em resumo exclusão social do que não damos conta de compreender. O louco deixa de ser um incomodo social, no momento que não mais faz parte da sociedade. Somente na atualidade se adquire um conceito de tratar o sofrimento psíquico como um ato de reinserção social, analisando toda a construção histórica da ideia de loucura, nos fica claro aspectos de vários discursos estabelecidos socialmente. Como o popular: “Por que ainda não internaram esse incomodo?” 
Analisemos agora a construção social de outro entendimento de doença. “Chega a São Paulo a temida peste gay” Não, não é piada com o time de futebol. Como será a construção social do conceito de uma doença que é anunciada a população desse modo? Ao longo de anos as formas de primeiras apresentações sociais da AIDS geraram mais estragos do que o próprio vírus HIV, contribuíram para o preconceito e exclusão social. Também construíram para alguns a falsa visão de imunidade, sendo considerada como uma peste de gays e prostitutas, todos fora do quadro considerado de risco sentiam-se seguros, como se não pudessem ser contaminados, o que certamente contribuiu de maneira eficiente para a maior proliferação do vírus, já quem não estava dentro do quadro de risco, não via necessidade em se proteger. E quando analisamos o contexto histórico da época, entendemos melhor, questões como o fato de existir um preconceito, e ideia de exclusão social de gays maior do que é a atual. Percebemos possíveis jogos de interesses, em culpar a um grupo por essa nova doença. Isso fica mais notável ainda analisando as primeiras campanhas realizadas.
A partir disso nos fica mais clara certas relações sociais construídas acerca da AIDS e desse modo, podemos entender as relações sociais estabelecidas, com cada uma das doenças existentes, das mais comuns até as mais raras, assim como as relativamente comuns, mas que tem uma relação social de grande impacto, como é o caso da lepra. Uma doença que assim como a loucura, gerou grande exclusão social. Consideremos que estamos falando de uma doença altamente contagiosa, em um período onde não havia cura, esse contexto criou leprosários, que assim como os manicômios cumpriram uma grande função de exclusão de um incomodo social.

As Politicas Públicas.

A politica pública consiste em um arranjo do Estado para atender a demandas socioeconômicas do território. Não trata-se de favor a população como muitos pensam e relatam. O Estado nada dá, ele apenas converte uma arrecadação de imposto, em retorno social para questões de uso comum, ou necessidades que de outro modo não seria acessível a maioria da população, gerando prejuízos para o estado. Por exemplo: Para o Estado se manter, precisa de arrecadação de impostos, para arrecadar imposto, precisa de trabalhadores, por tanto é de interesse do Estado ter pessoas saudáveis em seu território, pois do contrario não tem pessoas trabalhando, não arrecadando imposto, levando a uma falência do estado.
Há uma relação de interesses intrínseca ao convívio social, igualmente ocorre uma relação do gênero com o Estado.
Politicas públicas sempre envolvem um forte jogo de interesses, sejam estes lícitos, como a manutenção do Estado através de arrecadação de impostos, a formação de novos profissionais para o mercado de trabalho, ou interesses ilícitos, como propinas e benefícios individuais em detrimento do bem coletivo.
Mas lembremos sempre, que neste jogo de interesses, somos parte fundamental, não apenas como usuários dos sistemas públicos, mas também como parte construtora dos mesmos.
O SUS por exemplo, que consiste em um Sistema Único de Saúde, foi construído por participação direta de movimentos sociais. Antes da construção desse sistema único, a saúde era uma bem de direito restrito, apenas tinha acesso a ela a partir de INANPS, quem tinha um emprego registrado, deixando assim descoberto de assistência uma grande parte da população, através de pressão popular, se instituiu a partir da lei 8.080 e 8.142 de 1988 a saúde como um direito disponível a todos, teoricamente sem exclusão.
A partir de então, após a lei de 1988, a saúde não mais é responsabilidade do sujeito, mas sim do Estado. Nessa construção tivemos a participação ativa dos cidadãos, mas o que muitos desconhecem, é o fato de que essa participação deve ser permanente e não apenas durante a construção, é uma participação a qual foi conquistada pela lei 8.142, que garante o direito ao usuário da politica de SUS, construir alterações no sistema ao longo do seu uso. Essas alterações podem ser construída a partir de reclamações e sugestões mediante setores responsáveis, mas pode mais ainda, contar como uma participação efetiva na solução de dificuldades, pois o sistema é alterado através de processos aos quais todos tem o direito de participar ativamente.

Premissas estabelecidas para o funcionamento do SUS

Saúde como direito de todos e dever do Estado; Significa que incumbimos o Estado de se responsabilizar pela saúde da nação e através dos impostos que pagamos sustentamos essa prática, por isso saúde não é favor do Estado, mas sim obrigação.
Descentralização (poder, recursos, gerenciamento e execução); A ideia de descentralização, parte de uma noção de tornar os recursos mais acessíveis ao máximo de pessoas possível, não apenas de um território demarcado, mas sim de uma grande região atendida através de vários pontos difusos. 
Universalização (um SUS para todos); uma ideia de serviço disponível para toda a população territorial, estando empregada ou não, sendo de qual etnia e credo for, sendo de qualquer posição politica, social, religiosa ou não religiosa. 
Hierarquização da rede assistencial; Uma proposta de finalidade a agilizar o atendimento, que infelizmente nem sempre é respeitada, nem por gestores nem por usuários. A intensão de ter hierarquias de complexidade, visa resolver logo nos serviços básicos o que é de solução básica, subindo a complexidade de acordo com a necessidade, sendo assim, somente chegaria nos níveis mais complexos e caros, aqueles casos que de fato precisassem, gerando um menor custo de manutenção e menos aglomeração em serviços complexos. Infelizmente o mal uso desse sistema, acaba por diversas vezes fazendo com que o que era para ser uma vantagem se torne desvantagem.
Equidade; Uma noção de direitos iguais para necessidades iguais e direitos diferentes para necessidades diferentes, nem todos tem acesso aos seus direitos com politicas simplesmente igualitárias, para isso se propõe a noção de equidade, tratar pessoas de maneira diferente de acordo com a sua diferença. Em um exemplo simples, mas plausível: Eu posso afirmar que tendo um posto de saúde no bairro, ambos os vizinhos desse posto tem acesso igual a ele, pois moram ao lado, mas um desses vizinhos, tem locomoção “normal”, outro tem locomoção através de uma cadeira de rodas, se o posto de saúde tem escadarias sem uma rampa de acesso, de fato ambos tem direito de acesso igual? A pessoa que pode caminhar, e a que tem de rodar? Nesse caso percebemos de maneira fácil que uma das pessoas tem maior acesso ao serviço do que outra, mesmo ambas estando em condições de igualdade. Nesse caso a igualdade se torna excludente, pois as pessoas não são iguais, segundo a visão de equidade eu tratarei ambos de maneira diferente, para que ambos tenham direitos iguais. Isso é equidade.
Integralidade; Ver o sujeito como um todo integral e não como pedaços de um corpo, faz parte da visão do sistema de saúde.
Participação social (mecanismos: Conselhos e Conferências de Saúde); é preciso a noção da população que ela é parte integrante da construção de melhorias nas politicas. Os conselhos e conferencias de saúde entram como uma forma de acesso da população a interferência e modificação das politicas de atendimento.

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